Manifestantes danificam exposição fotográfica sobre trabalho escravo nas oficinas de costura

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Andre Montanher

Um grupo de cerca de 30 pessoas danificou as peças da exposição “Oficina do Suor”, do fotógrafo e Auditor-Fiscal do Trabalho Sérgio Carvalho. A mostra foi promovida pelo Sinait (Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais do Trabalho) e a Casa de Criadores, retratando o trabalho degradante nas oficinas de costura de São Paulo-SP. Gritando palavras de ordem, eles jogaram tinta vermelha sobre as imagens, que estão expostas na Galeria Prestes Maia.

As fotografias retratavam o trabalho análogo ao de escravo na produção de peças de vestuário, encontrado em profusão nas pequenas oficinas paulistanas, que utilizam a mão de obra de trabalhadores – especialmente imigrantes. Devido ao ato, a exposição foi cancelada.

A vandalização iniciou por volta das 19h30, hora marcada para abertura da exposição. Nem mesmo com a presença da Guarda Civil Metropolitana foi possível conter o grupo que, munido de megafone, tinta e cartazes, danificou as obras e o prédio histórico onde está situada a Galeria Prestes Maia.

“Estamos chocados, mas sinceramente não conseguimos compreender completamente a  proposta do grupo. Por que querem esconder o trabalho escravo nas oficinas de costura em São Paulo? As telas foram destruídas e é impossível retirar a tinta”, apontou Sérgio Carvalho.

Durante o processo de construção da exposição, foram feitas várias tentativas de diálogo com o grupo denominado “Cholitas”, intermediado pela própria Casa de Criadores, mas sem sucesso, em razão da postura intransigente do grupo em determinar o cancelamento da exposição.

No momento da ação, uma pessoa foi detida pela Guarda Civil Metropolitana, mas não há informações se ela teria sido presa. A Polícia Militar foi acionada posteriormente, e fez registro do acontecimento. Um boletim de ocorrência seria registrado pela organização do evento.

“Não conseguimos compreender o porquê de não quererem dar visibilidade a esse grave crime contra os direitos humanos. Por que não querem fazer essa denúncia? Acreditamos que a luta contra o trabalho escravo é de toda a sociedade.  De qualquer forma, parecem não compreender a proposta”, questionou Ana Palmira Arruda Camargo, presidenta do Sinait-SP (Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais do Trabalho) – Delegacia Sindical de São Paulo.

EXPOSIÇÃO E WORKSHOP CANCELADOS

A exposição iria até 10 de dezembro. No dia 10 de dezembro, Auditores Fiscais do Trabalho de São Paulo realizariam um workshop “Da Oficina Do Suor Ao Trabalho Digno”, com carga horária de 4 horas, sobre a promoção de trabalho decente na indústria da moda, do qual deveriam participar 60 estilistas da Casa de Criadores.

Durante o workshop, seriam abordadas as principais características da indústria da moda, da organização produtiva e do “sistema do suor” como antítese do trabalho decente. Em razão do ato que destruiu as obras, a ação foi cancelada. O workshop seria mais uma oportunidade de diálogo amplo para discutir e procurar soluções para esse grave problema social.

O Sinait-SP lamenta o ocorrido e reafirma sua posição de contrariedade às condições análogas às de escravo que flagelam tantos trabalhadores na indústria da moda e em outras atividades. Arte não é o problema, o problema é o problema.

SÉRGIO CARVALHO 

Publicou no ano de 2010, em coautoria com o fotógrafo Paulo Gutemberg, o livro Docas do Mucuripe e o livro “Retrato Escravo”, em coautoria com o fotógrafo João Roberto Ripper, indicado como um dos melhores livros de 2010 pelo Internacional Photobook Festival 2011 (Kassel, Alemanha) e Menção Honrosa no POY LATAM 2013. Em 2011, publicou “Barbearia do Tempo”. Nos anos seguintes, publicou “Às vezes, criança – Um quase retrato de uma infância roubada”, em coautoria com o poeta maranhense Rubervam Du Nascimento e “Homens-Caranguejo” (publicação coletiva). Em 2016, publicou os livros “Caminho das Abelhas” (publicação coletiva) e “Sereias”, em coautoria com a fotógrafa Fernanda Oliveira. Em 2018, publicou “Barreiro Branco”, cujo ensaio foi vencedor no Festival Verbo Ver 2018, em Fortaleza/CE e menção honrosa no Festival Paraty em Foco/2019. Em 2021, publicou o livro “Santo Sertão”.

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ANEXO: RELATO DE UMA INSPEÇÃO DO TRABALHO

Durante conversa sobre promessa de emprego em oficina de costura em São Paulo, um adolescente, 16 anos, resgatado pelos Auditores-Fiscais do Trabalho, mencionou à equipe de fiscalização que: “(…) o Sr XXXX [boliviano, proprietário de oficina de costura em São Paulo] o convidou para ir pessoalmente conversar sobre a oferta de emprego (…) que lhe prometeu pagar cerca de 4 a 5 reais por peça de roupa (…) que advertiu o Sr. XXXXX sobre o fato de que não tinham [ele e sua companheira, também adolescente] idade suficiente  para cruzar a fronteira, mas o Sr. XXXXX lhes disse que isso não seria problema e lhes forneceu documentos falsificados (…). Ainda no mesmo depoimento, o mesmo adolescente disse: (…) Como não tinham experiência, conseguiam – os dois adolescentes – costurar apenas 33 peças em uma semana, trabalhando das 07h00 às 23h00 (…) como produziam pouco, o Sr XXXXX começou a assediá-los, dizendo que estavam trabalhando mal, que não aprendiam nada, e chegaram a receber pelo trabalho menos que o prometido, 1,60 reais por peça (…) a partir daí, o tratamento foi piorando,a comida era somente arroz, feijão e carne crua (…) que aos sábados e domingos, era proibidos de utilizarem a cozinha, só podiam comer frutas, e ainda o Sr. XXXX retirava os botões do fogão e os impossibilitava de usar o equipamento (…). Esse é um das centenas de depoimentos tomados pelos Auditores do Trabalho quando em fiscalização nas oficinas do suor em São Paulo.

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