sábado, 20 abril, 2024
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Na Alesp, especialistas criticam redução das Normas Regulamentadoras do Trabalho

Por Andre Montanher

Um público formado por 70 pessoas, entre engenheiros e técnicos do trabalho, representantes sindicais, auditores fiscais do Trabalho e outros profissionais, participaram da audiência pública “A Importância das Normas Regulamentadoras do Trabalho”, realizada na Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo), nesta quarta-feira (26). Confira AQUI a íntegra do evento em vídeo.

O evento, promovido pelo Sinait-SP e a deputada estadual Beth Sahão, presidente da Comissão de Direitos Humanos da Alesp, reuniu especialistas do setor para debater o anúncio, pelo governo Bolsonaro, da redução em até 90% das NRs (Normas Regulamentadoras) do Trabalho, e suas implicações.

Beth Sahão e Rodrigo Iquegami
Público compareceu ao auditório da Alesp

“Atendi prontamente ao pedido do Sinait-SP, pois é muito importante termos acesso às informações técnicas sobre as intenções do governo atual”, iniciou o evento a deputada. “Que daqui saiam encaminhamentos, para que a gente possa pressionar as pessoas que são de direito para que evitem estas mudanças, que certamente serão capazes de aumentar o número de acidentes e de mortes que temos no Brasil, em decorrência do trabalho”, completou.

O presidente do Sinait-SP, Rodrigo Iquegami, enfatizou a falta de qualquer debate ou suporte técnico, nas intenções tornadas públicas por Bolsonaro. “Identificamos a perigosa ideia, desprovida de qualquer substrato técnico, de que toda e qualquer desregulamentação econômica é positiva. Impera no país a idéia de que existe um excesso normativo, e que mudar isso trará eficiência ao mercado”, assinalou.

Iquegami nominou de “esdrúxula”, a hipótese de um corpo de fiscalização do Trabalho, desprovido das normas que embasem a inspeção. “A equipe vai lá e pode até identificar o problema, mas nada será feito”, situou.

Marcus Barberino
Juarez Correia Barros Júnior

 

PREVENÇÃO

O juiz Marcos Barberino, que representou a Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho), persistiu na importância das fiscalizações citando o caso Shell-Basf, uma das maiores indenizações trabalhistas da história brasileira. “No Judiciário, somos quase arqueólogos, pois temos de lidar com o passado”, pontuou, ressaltando todo o universo de infrações pregressas ocorridas até o ajuizamento da ação.

“Reduzir as normas regulamentadoras apenas para produzir efeito microeconômico, sequer mensurável, é negativo”, continuou. Sobre a necessidade do regramento no ambiente trabalhista brasileiro, lembrou o caso da NR 31, que obriga o oferecimento de água potável ao trabalhador. “Acreditem, temos de ter uma NR para obrigar isto”, exclamou.

O auditor fiscal do Trabalho, e membro da Comissão Tripartite que analisa as NRs, Juarez Correia Barros Júnior, lamentou a forma “desrespeitosa” com que o governo Bolsonaro anunciou a redução do conteúdo das normas. “Ficamos sabendo inicialmente por meio do Twitter, e estamos totalmente alheios sobre como seria a redução de 90% das normas. Seria 90% de todas as normas, ou a extinção de algumas? Vamos extinguir a NR 12 e liberar totalmente o uso de maquinários nas indústrias?”, questionou.

Barros Júnior relatou já ter ciência sobre profissionais que estão tendo projetos de segurança e saúde do Trabalho sendo recusados pelas empresas. “Empresários dizem que vão aguardar o que vai ocorrer, numa prova do efeito nocivo deste tipo de anúncio”, apontou.

OAB

Tainã Góis
Paula Collesi
Cyntia Santos Braga

 

A exemplo do juiz Barberino, advogados acostumados na lida diária com processos referentes a acidentes e doenças do trabalho também enfatizaram a necessidade da prevenção. Paula Colessi, da Comissão de Direitos Humanos da OAB-SP, lembrou que “Um acidente do trabalho não é interessante para nenhum dos atores, nem para as empresas. Tem dias de trabalho perdido, tem indenizações, e o INSS entrando com ações de dano reversivas”, apontou.

Ela citou o caso da gigante norte-americana do aço, Alcoa. Quando a empresa teve a rentabilidade diminuída, por conta do aumento da concorrência, trouxe novo executivo que apontou a solução: “Focar na questão dos acidentes de trabalho, como elemento mais propenso a conter gastos e retomar a rentabilidade. A produtividade da empresa cresceu 5 vezes”, relatou.

Tainã Góis, também da Comissão de Direitos Humanos da OAB-SP, se aprofundou na enganosa questão da caracterização das NRs enquanto “custos”. “Se as normas precisam ser modernizadas, temos de ter em mente que modernizar não pode significar precarizar. Ao evitar acidentes, elas na verdade evitam os custos”, apontou.

Pela Comissão de Direito do Trabalho da OAB-SP, a advogada Cyntia Santos Ruiz Braga, lembrou o aspecto humano, desprezado no cálculo imediatista sobre custos do processo produtivo. E citou o problema dos riscos à saúde e segurança do trabalho. “Vivemos numa sociedade do risco, que naturaliza e legitima a tolerância ao risco no ambiente do trabalho. Em nome de um progresso econômico, indeniza-se o trabalhador com adicionais, mas sem cuidar da prevenção, da precaução”, finalizou.

O presidente do Sinpetro (Sindicato dos Petroleiros de São Paulo), Itamar Sanches, e a presidente do Sindicato dos Trabalhadores na Saúde de São Paulo, Jucileide da silva, também realizaram exposição. Ao final, os presentes puderam debater com os palestrantes.

MOÇÃO

A deputada Beth Sahão deve apresentar na Alesp, uma moção de repúdio ao anúncio da redução das normas regulamentadoras, pelo governo Jair Bolsonaro. “É preciso fazer o enfrentamento desta questão. Encontramos na Comissão de Direitos Humanos da Assembleia, um ponto de apoio aos interesses da sociedade e até da racionalidade técnica, para a proteção da saúde e da segurança no Trabalho”, finalizou Rodrigo Iquegami.

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