quarta-feira, 29 outubro, 2025
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41º ENAFIT: Justiça climática e mundo do trabalho, ministro Lélio Bentes destaca papel dos AFT diante da crise climática

Por: Lourdes Marinho/Edição: Andrea Bochi

O ministro Lélio Bentes, do Tribunal Superior do Trabalho (TST), destacou o papel estratégico e urgente dos Auditores-Fiscais do Trabalho na proteção dos trabalhadores diante da crise climática, durante a Conferência Magna – Justiça climática e os impactos no mundo do trabalho, nesta terça-feira, 27 de outubro, no 41º Encontro Nacional dos Auditores-Fiscais do Trabalho (ENAFIT), em Belém. Bentes enfatizou que a Inspeção do Trabalho é fundamental para identificar e mitigar riscos ambientais que comprometem a saúde e segurança dos trabalhadores mais vulneráveis.

Também elogiou a iniciativa do ENAFIT que levará a programação técnica desta terça-feira, 28 de outubro, para a Ilha do Combu, onde os AFT vivenciarão as realidades de comunidades quilombolas e ribeirinhas impactadas pela crise ambiental. “Essa ação permitirá que os Auditores se conectem diretamente com comunidades quilombolas e ribeirinhas na Ilha do Combu, com o objetivo de conhecer suas realidades e ouvir suas demandas”, disse Lélio Bentes ressaltando a importância de dar voz a quem historicamente tem pouco espaço, e enfatizando o papel do ENAFIT em criar essa ponte.

A diretora do SINAIT, Rosa Maria Campos Jorge, que coordenou a mesa da conferência, lembrou que o evento na Ilha do Combu contará com a participação de especialistas e ativistas, como a professora doutora Sandra Suely (UFPA), Juliana Alves (secretária de Estado dos Povos Indígenas do Ceará), Vanuza do Abacatal (liderança do quilombo Abacatal), professor Aiala Couto (Instituto Mãe Crioula e professor da UEPA) e Dona Dara (liderança indígena e coordenadora do grupo de mulheres trabalhadoras ribeirinhas), garantindo um rico intercâmbio de experiências e conhecimentos.

O ministro disse ainda que a Inspeção do Trabalho, como política pública, deve ser valorizada, aparelhada e, sobretudo, independente. Ele lembrou a trajetória de Auditores-Fiscais que construíram e estruturaram a carreira, como Vera Jatobá e outros, defendendo a necessidade de investimento contínuo.

Mais da conferência

Lélio Bentes iniciou sua fala resgatando um ensinamento ancestral, popularizado por Wendell Berry: “Nós não herdamos o planeta dos nossos pais, nós o tomamos emprestado dos nossos filhos”. Segundo ele, essa máxima, alinhada à Agenda 2030 da ONU, sublinha a responsabilidade de legar às futuras gerações um planeta habitável. Ele ainda traçou um paralelo com o Decreto nº 1.313 de 1891, que já àquela época, designava a Inspeção do Trabalho para combater a precarização que compromete o desenvolvimento social, antecipando princípios da OIT sobre trabalho humano e justiça social.

O ministro abordou a crise socioambiental a partir da perspectiva do Papa Francisco, que define o planeta como a “única casa do ser humano”. Criticou a mentalidade de que uma minoria pode “sonhar com a possibilidade de ir para Marte caso dê tudo errado por aqui”, enquanto a maioria da humanidade é tratada como “descartável”. Bentes contextualizou a crise com dados alarmantes: o aquecimento global de 1,1°C acima dos níveis pré-industriais, sendo 90% atribuído à ação humana. As consequências são visíveis: incêndios na Europa e Ártico, inundações, secas prolongadas na Amazônia e Pantanal. “Não estamos todos no mesmo barco, mas enfrentamos a mesma tempestade em barcos muito diferentes”, afirmou, destacando a desigualdade na distribuição dos impactos ambientais.

Justiça Climática e Racismo Ambiental

A partir dessa desigualdade, o ministro introduziu os conceitos de Justiça Climática e Racismo Ambiental. A Justiça Climática busca a distribuição equitativa de custos e benefícios das ações ambientais. “Quem sofre mais e paga a conta da destruição do planeta é quem menos tem acesso aos benefícios gerados por essa ação devastadora”, sentenciou. Citando o advogado e ativista Tiago Amparo, Lélio Bentes afirmou que “o calor tem cor e tem classe”. Ele questionou os participantes do evento sobre acesso a ar-condicionado, transporte refrigerado e água potável, ilustrando como as mudanças climáticas afetam desproporcionalmente populações vulneráveis: indígenas, quilombolas, ribeirinhos e trabalhadores mais pobres.

O ministro enfatizou a vulnerabilidade dos trabalhadores, citando relatório da OIT que aponta 2,4 bilhões de pessoas expostas ao calor excessivo e dados sobre mortes por poluição do ar e pesticidas. Listou os seis principais impactos das mudanças climáticas na saúde e segurança do trabalho: poluição do ar, estresse térmico, radiação UV, doenças transmitidas por vetores, acidentes de trabalho e impactos psicossociais.

Lélio Bentes alertou sobre a rapidez com que nos aproximamos do ponto de não retorno de 1,5°C de aquecimento global. “O tempo se esgota com uma rapidez maior do que a prevista”, disse. Sem ação agressiva, a temperatura média pode aumentar em 2,4°C até 2050, quebrando um recorde de 3 milhões de anos e resultando na perda de calotas polares e elevação drástica do nível do mar. Ele citou a Amazônia e o Cerrado, que de “sumidouros de carbono” se tornaram emissores devido ao desmatamento e queimadas.

Diante desse cenário, o ministro defendeu a “transição justa”, que busca combater as mudanças climáticas de forma equitativa e inclusiva, gerando trabalho decente e prevenindo o desemprego. Ele destacou a necessidade de alinhamento de políticas, fortalecimento da governança e mobilização de financiamento. Lélio Bentes reforçou ainda a importância da participação e inclusão das populações diretamente envolvidas na formulação de políticas climáticas. Criticou a prospecção de petróleo na Foz do Amazonas, onde o direito de consulta das comunidades indígenas não foi respeitado.

Encerrando sua conferência, Lélio Bentes reiterou a recomendação da OIT sobre o diálogo social como caminho para soluções justas. Reafirmou a disposição da Justiça do Trabalho em intercâmbiar com a Inspeção do Trabalho e outros órgãos na missão de garantir o direito humano ao trabalho decente e desejou vida longa à Inspeção do Trabalho e sucesso aos participantes do ENAFIT.

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