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Em artigo, Auditores abordam a unificação da inspeção trabalhista e previdenciária

Publicado originariamente no portal Migalhas

A unificação da inspeção trabalhista e previdenciária (não exclusiva) e a ampliação da competência do Conselho de Recursos da Previdência Social – CRPS para o julgamento dos autos de infração trabalhistas

JAIR TEIXEIRA DOS REIS, JULIE SANTOS TEIXEIRA, ABEL FERREIRA LOPES FILHO E RONALD SHARP JUNIOR

A experiência na fiscalização de folhas de pagamento e no recolhimento do FGTS pelos Auditores Fiscais do Trabalho justifica, pela identidade de base de cálculo e pelos resultados obtidos, que os ocupantes dessa carreira passem a deter competência para a fiscalização das contribuições previdenciárias.

TERÇA-FEIRA, 20/8/2019

Introdução

O objetivo deste artigo é abordar a atribuição da competência previdenciária aos Auditores Fiscais do Trabalho e a correlata ampliação da competência do Conselho de Recursos da Previdência Social – CRPS para incluir o julgamento dos autos de infração trabalhistas.

O tema ganhou recente destaque com a previsão, no texto aprovado pela Comissão Mista que analisou a MP 881 (chamada de MP da Liberdade Econômica) do julgamento das autuações trabalhistas por um conselho recursal tripartite, identificado por muitos como uma espécie de “CARF” trabalhista, mediante nova redação ao art. 635 da CLT.

Por decisão do presidente da Câmara, na esteira do julgamento proferido pelo STF na ADIn 5.127, o texto proposto foi retirado de apreciação por não guardar relação temática com a redação original da MP 881. Mas o Governo não desistiu do assunto e o Secretário Especial de Previdência e Trabalho sinalizou que poderá reapresentá-lo por meio de projeto de lei (cf. Valor Econômico, edição de 15/8/19, p. A10).

Em passado recente, o ex-ministro do Trabalho, dr. Caio Vieira de Mello, começou a discutir o tema e incumbiu um grupo de Auditores Fiscais do Trabalho a tarefa de redigir um projeto de instituição do Conselho de Administrativo de Recursos Trabalhistas (processo 460 100011462018 registrado no Controle de Processos e Documentos – CPRODWEB no dia 15 de outubro de 2018).

Em 13/6/06, um dos autores deste artigo criticou o julgamento monocrático dos recursos interpostos contra as decisões que apreciam os autos de infração trabalhistas e, com fundamento no art. 10 da Constituição da República, propôs a criação de uma segunda instância colegiada (Jornal do Commercio – Rio de Janeiro – 13/6/06 – p. A-16)

Da mesma forma, os outros autores vêm defendendo, em trabalhos doutrinários e na academia, a instituição de uma segunda instância colegiada para o julgamento das autuações trabalhistas.

Fiscalização previdenciária pelos auditores fiscais do trabalho

A experiência internacional demonstra que, por critérios de afinidade, sistematização e racionalidade, os temas trabalho e previdência são reunidos numa única pasta ministerial e são fiscalizados por um mesmo corpo de auditores, com aproveitamento de sinergias e resultados positivos para a sociedade.

Ao mesmo tempo, a MP 886/19, por meio da proposta de emenda aditiva número 52, pode vir a unificar as competências relativas à previdência e trabalho, no âmbito da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, do Ministério da Economia, permitindo que seja novamente discutida uma questão que remonta há décadas, que é a dissociação entre as auditorias fiscais trabalhista e previdenciária e a necessária implementação de sua reunificação.

A Auditoria Fiscal Trabalhista tem como função precípua o combate ao descumprimento das normas de proteção ao trabalho, porém não possui competência expressa para fiscalizar o cumprimento da legislação previdenciária, especialmente o recolhimento de contribuições relacionadas ao vínculo de emprego, como a contribuição sobre a folha de pagamento para custeio do RGPS, previstas no art. 195, I, “a” e II da Carta Magna, por exemplo. Mas detém competência para fiscalizar o FGTS, o qual toma por base o mesmo critério utilizado para a fiscalização previdenciária, atualmente a cargo da Receita Federal.

Note-se que já é atribuição dos Auditores Fiscais do Trabalho a auditoria e fiscalização da contribuição social prevista na LC  110, de 2001, de natureza tributária indiscutível. Ademais, parte da fiscalização previdenciária também é conferida à Auditoria Fiscal Trabalhista, na medida em que lhe toca fiscalizar o cumprimento, por parte das empresas, da cota de Pessoas com Deficiência (lei previdenciária 8.213/91, art. 91, c/c o decreto 3.298/99).

Mencione-se ainda o adicional de contribuição previdenciária de 6, 9 ou 12% nas atividades insalubres, os quais demandam análise, pela autoridade fiscal, do PPRA e do LTCAT, documentos totalmente estranhos à fiscalização exercida pela Receita Federal.

Releva compreender que a atividade do Auditor Fiscal do Trabalho tem impacto direto na Contribuição Previdenciária, ao coibir as fraudes na relação de emprego. A Inspeção do Trabalho atua em benefício da competitividade das empresas, na medida em que coíbe a ocorrência de dumping social, oferecendo um ambiente favorável e equilibrado de negócios.

Embora o lançamento das Contribuições Previdenciárias seja da competência da Receita Federal, este é impactado pela ação dos auditores do trabalho, que reúnem o conhecimento para a análise de contratos de trabalho e o seu confronto com a realidade do ambiente laboral. Essa expertise permite detectar fraudes e incorreções que afetam as bases de cálculo de diversos tributos, além de permitir que o Tesouro seja ressarcido por dispêndios causados por terceiros, através da análise de acidentes de trabalho e outras atividades atinentes à garantia das condições de salubridade nos ambientes laborais. São as chamadas ações regressivas previdenciárias.

A emenda aditiva número 52 à medida provisória 886/19 propõe que os Auditores Fiscais do Trabalho exerçam atividades de auditoria e fiscalização do cumprimento da legislação sobre regimes próprios de previdência social e previdência complementar.

Em tempos de corte de gastos, o combate à sonegação deve ser intensificado demonstrando a necessidade dos auditores fiscais do trabalho, que já auditam e fiscalizam a arrecadação do FGTS, sejam autorizados a fazerem o mesmo em relação à Previdência, atendendo ao princípio da eficiência estabelecido no caput do art. 37 da Constituição Federal, bem como ao princípio da economicidade, previsto no caput da art. 70 da mesma Carta.

A solução passaria por alocar o corpo de Auditores Fiscais do Trabalho na tarefa de fiscalizar a regularidade no recolhimento de contribuições previdenciárias, em competência concorrente com os Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil e sem qualquer prejuízo para as atribuições dessa carreira. Seriam adicionados aos novecentos Auditores da Receita, nesse esforço, cerca de dois mil e duzentos Auditores do Trabalho dotados de grande expertise na análise de folhas de pagamento e na configuração de vínculos empregatícios, fatos geradores de contribuições previdenciárias.

Cabe destacar que desde a criação da Secretaria da Receita Federal do Brasil, que unificou a fiscalização de impostos federais e contribuições previdenciárias, a fiscalização da contribuição previdenciária não tem sido realizada a contento, em razão da considerável redução de Auditores responsáveis pela fiscalização da inadimplência e sonegação da Contribuição Previdenciária. Isto gera um prejuízo de R$ 30 bilhões à Previdência, e R$ 5 bilhões do Seguro de Acidente de Trabalho (SAT/RAT), que também é suportado pela Previdência.

Esses são apenas os valores descontados dos trabalhadores e que não são repassados para aos cofres públicos. Trata-se de valores que poderiam facilmente ser detectados se houvesse a fiscalização concorrente realizada pela Auditoria Fiscal do Trabalho.

Os Auditores Fiscais do Trabalho geram a formalização de vínculos de emprego em suas fiscalizações que arrecadam valores superiores a R$ 4 bilhões por ano para a Previdência (disponível aqui). Tais valores poderiam ser potencializados a partir do momento em que se compartilhe a fiscalização da contribuição previdenciária, de forma a promover uma sinergia de resultados em favor da União, sem qualquer aumento de despesa. Considerando as diferenças de alíquotas previdenciárias nas bases de cálculo envolvidas, os valores de contribuição previdenciária poderiam atingir cerca quatro vezes o montante de FGTS.

A referida adequação não trará qualquer ônus para a administração e propiciará um real incremento na arrecadação da receita previdenciária, exatamente na linha de reorganização de atividades, otimização dos custos com pessoal e busca de eficiência almejadas pelo Governo. Devem ser buscados resultados concretos a partir da racionalização e aprimoramento da prestação de serviços pelo Estado.

Conselho recursal de autos de infração trabalhistas

Neste cenário, a chamada MP da Liberdade Econômica, 881/19, ventilou a oportunidade de ser criado um colegiado para apreciar os autos de infração lavrados pelos Auditores-Fiscais do Trabalho. Porém foi visto acima que esse item não prosperou na recente votação desta medida na Câmara dos Deputados em 13/8/19.

Mesmo assim, urge uma atualização no sistema de julgamento desses autos administrativos infracionais, até porque o combate à sonegação e a ampliação da base da arrecadação reforçarão esse espectro.

Atualmente, é bastante peculiar essa instância recursal, por ser atribuição de uma só autoridade (art. 635 da CLT e suas atualizações por normas ancilares). O julgamento monocrático contrasta com o mandamento constitucional (art. 10) que privilegia o julgamento colegiado nos órgãos públicos decidam sobre questões trabalhistas e previdenciárias.

Os sistemas de contencioso administrativo tributário e previdenciário, por exemplo, já adotam o modelo colegiado de longa data.

No caso previdenciário há o Conselho de Recursos da Previdência Social – CRPS, criado em 1939, na época com o nome de Câmara da Previdência Social do Conselho Nacional do Trabalho. Recebeu sua atual denominação em 1966 e foi transferido para Brasília em 1993. O CRPS é composto por 29 Juntas de Recursos distribuídas por todo o Brasil e quatro Câmaras de Julgamento localizadas capital federal.

Consagrada está a aplicabilidade, no âmbito administrativo, do Princípio do Duplo Grau de Jurisdição como uma garantia fundamental.

Ocorre que, ao se impor uma penalidade, ainda que administrativa, é necessária a adoção do Princípio da Colegialidade. De índole processual, tal Princípio estabelece que a parte tem o direito não somente de recorrer a uma instância superior, mas igualmente de ter o seu recurso apreciado por um órgão de estrutura colegiada. É decorrência lógica do Princípio do Duplo Grau de Jurisdição que permeia a Constituição.

O contencioso administrativo não é apenas um conjunto de procedimentos, mas um instrumento de efetivação de valores constitucionais.

Aproveitando-se da longeva experiência e credibilidade do CRPS, sem dúvida esse Conselho poderia ser ampliado para abrigar a competência trabalhista, tornando-se um Conselho de Recursos da Previdência Social e Trabalho – CRPST. Isto viria em absoluta correlação com a assunção, pelos Auditores Fiscais do Trabalho (e, quiçá, Previdência), da competência fiscalizadora previdenciária.

Não há dúvida de que o julgamento administrativo colegiado e paritário proporciona maior participação social, transparência e legitimidade de suas decisões.

Como foi dito, em tempos de corte de gastos e combate à sonegação, ampliar um Conselho já existente talvez seja medida mais eficaz do que criar um novo, partindo inteiramente de algo inexistente. De um lado, a Inspeção do Trabalho agrega a competência previdenciária, ainda que em concorrência com a Receita Federal, e, de outro lado, o CRPS é ampliado para o julgamento, em grau de recurso, dos autos de infração lavrados justamente pelos Auditores Fiscais do Trabalho. Trata-se de mecanismo correlato e inerente, pela evidente especialização da matéria, sistematização e pertinência temática. A providência ainda restabeleceria a necessária fiscalização trabalhista e previdenciária na mesma pasta da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, composta então por Auditores Fiscais detentores dessa competência, e propiciaria o julgamento colegiado por órgão (CRPS, que se tornaria CPRST) situado em idêntica estrutura, sem a incoerente dissociação da fiscalização previdenciária (Receita Federal) da Secretaria de maior hierarquia que está afeta às questões previdenciárias.

Conclusão

Em conclusão, a experiência na fiscalização de folhas de pagamento e no recolhimento do FGTS pelos Auditores Fiscais do Trabalho justifica, pela identidade de base de cálculo e pelos resultados obtidos, que os ocupantes dessa carreira passem a deter competência para a fiscalização das contribuições previdenciárias. Critérios de eficiência, especialização, racionalidade, sistematização de atividades e de afinidades temáticas conduzem inevitavelmente a esse raciocínio.

Uma vez estabelecida essa competência, o julgamento, em grau de recurso, dos autos de infração trabalhistas e previdenciários seria realizado pelo CRPS (transformado em CPRST), em concreção ao princípio da colegialidade (art. 10 da Constituição da República) e implementando providência há muito alvitrada, reagrupando a fiscalização trabalhista e previdenciária e seu órgão de julgamento no âmbito da mesma Secretaria de Governo incumbida das pastas de previdência e trabalho.

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*Jair Teixeira dos Reis é auditor fiscal do trabalho.

*Julie Santos Teixeira é auditora fiscal do trabalho.

*Abel Ferreira Lopes Filho é auditor fiscal do trabalho.

*Ronald Sharp Junior é auditor fiscal do trabalho.

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