O Desembargador Federal do Tribunal Regional do Trabalho da 19ª Região (TRT/Alagoas), Jasiel Ivo, disse que é preocupante a precarização de direitos que os avanços tecnológicos representam para o mundo do trabalho, durante a Conferência de Abertura do 40º Encontro Nacional dos Auditores-Fiscais do Trabalho (ENAFIT) nesta segunda-feira, 18 de novembro. O tema trouxe muitas reflexões importantes sobre o futuro do Direito do Trabalho no Brasil e os desafios que a Reforma Trabalhista ainda impõe.
O palestrante fez um resumo histórico do trabalho humano, percorrendo a escravidão, a servidão, os contratos de natureza civilista, o contrato de trabalho até chegar ao trabalho temporário e o trabalho por plataformas. Abordou do proletariado ao cibertariado ou infoproletários, com incursão na pejotização e a fiscalização do trabalho.
Lembrou o sofrimento de trabalhadores durante a Revolução industrial e a reação deles com a greve por melhores condições e direitos com a palavra de ordem “Ou vocês melhoram as condições ou não trabalhamos”. Naquele período o capitalismo substitui, em resposta, a mão de obra masculina pela feminina e infantil. “Era regra na época, crianças trabalhando nas minas de carvão ou nas fábricas em ambiente insalubre e perigoso”. Porém, o chamado de líderes da época pedia a união dos trabalhadores para que acabassem com as atrocidades e foi assim que começaram a se unir pelas lutas.
Já em 2012, o código civil reconhece que há prestação de serviços que tem que ser regida pela CLT. E destaca que a primeira “perna” que a reforma trabalhista “quebrou” foi a organização sindical dos trabalhadores. Hoje, há a discussão da escala 6×1, em uma PEC que tramita no legislativo. Esse tema ganhou força, de acordo com Jasiel, influenciado pelas redes sociais e já se vê a reação dos empresários.
Na reforma trabalhista de 2017, não foi apenas criada a lei 13.467/17, mas um conjunto de leis. A lei 6.019 que prevê a contratação temporária de serviço estabelecendo que o contrato temporário pode versar sobre atividades meio e fim nas empresas. “O que passou a dificultar para a fiscalização o reconhecimento do vínculo”.
A terceirização nas atividades meio para o Tribunal Superior do Trabalho – TST sempre foi considerada lícita, entretanto, a Justiça do Trabalho se manifestava contra a terceirização na atividade fim. Com a lei 6.019 foi permitida a terceirização ampla e irrestrita. “Atualmente, encontramos professores trabalhando em uma mesma escola sendo que cada um é regido por um sistema. Além disso, dependendo da forma como os trabalhadores são contratados a Justiça considera lícita a terceirização, mesmo que o trabalhador exerça atividade fim.
A classe trabalhadora de hoje está muito diferente daquela do proletariado da época da Revolução industrial, em que todos eram padronizados. Jasiel lamenta que hoje o trabalhador esteja pensando subjetivamente. “O motorista de Uber se considera empresário e esse foi um pensamento cruel que incutiram na cabeça do trabalhador. Da mesma forma, a tecnologia foi usada para isso, trazendo a ideia de que contribui para facilitar o trabalho”. Para ele, essa transformação está reduzindo a informalidade, já que os trabalhadores estão sendo obrigados a registrarem-se como Pessoas jurídicas. E essa relação está sendo mascarada como empreendedorismo.
Outra questão, o acúmulo de função é um fator que não existe mais, uma vez que o empregado é chamado de multifuncional, ele é estoquista, atendedor e também lava o banheiro da loja.
Segundo o desembargador, estamos vivendo uma nova revolução e a tecnologia está sendo usada para aumentar a carga de trabalho daqueles trabalhadores, por exemplo, que exercem atividades conectados a plataformas digitais, como Uber e Ifood e também aqueles que atuam por meio de Gig economy ou Sharing Economy. “A tecnologia atualmente aprofunda a exploração do trabalhador. Hoje temos trabalhadores que usam o seu celular e sua bicicleta para fazer entregas e não possuem nenhuma proteção social”
É relevante destacar que a relação trabalho capital sempre teve a precarização como um elemento componente, mas no contexto das novas tecnologias, a referida precarização é intensificada.
Para Jasiel, diante de tudo isso, ainda observa-se a necessidade de organização da classe trabalhadora que ao longo dos últimos anos vem sendo desmobilizada. “A reforma trabalhista trouxe a quebra do sistema sindical que possibilitava uma discussão de direitos em pé de igualdade, o que ficou muito prejudicado com a reforma trabalhista”. E acrescentou como reflexão que, segundo ele, a sociedade precisa fazer sobre o rumo que deve ser tomado com a criação de uma classe de trabalhadores sem nenhuma proteção social.
Há vários aspectos que suscitam questionamentos sobre a conformidade da reforma trabalhista com a Constituição Federal. Ele defende a manutenção de um equilíbrio entre os interesses econômicos e a proteção dos direitos dos trabalhadores, conforme previsto no artigo 7º da Constituição.